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Como Pintor

Gilberto Freyre
- Villa-Chan Neto, Pintor amigo
Foi com um prazer todo especial que atendi a um seu pedido, Francisco Villa-Chan Neto, para escrever breve apresentação de um grupo de quadros – lindos quadros! – que constituíram sua recente exposição no Recife. Isto na véspera da viagem à Europa de que acabo de regressar. Quase sem tempo para escrever fosse o que fosse.

O que você, Francisco Villa-Chan, desejava era que essa minha rápida, breve, apresentação, fosse um testemunho relâmpago. Testemunho de talvez pintor – diga-se claramente – sobre pintor inconfundível: mestre de sua arte.

Sobre pintor que sabe sua arte, quer por vocação um tanto de família – descendente do sempre mestre Telles Junior – quer por ter estudado com os Rego Monteiro, com Lula Cardoso Ayres, com Francisco Brennand, com Reynaldo Fonseca. Portanto com uma constelação de mestres.

A pintura sabe-se que não é rigorosamente uma só. E vária. Por isso Picasso variou tanto de expressão pictórica. Ou de expressão artística, dado que a certa altura juntou à pintura a cerâmica. E sempre de modo superiormente inovador.

Você Francisco Villa-Chan, fixou-se numa expressão de pintura em que se sente o vigor da disciplina conciliada com o gosto por tradição de sua escolha. Também o gosto por cores brasileiramente tropicais que fazem do seu colorido uma festa de vibrações.

Daí o encanto com que consegue surpreender da velha Olinda, aquietada em cidade apolineamente viúva, casas antigas entre verdes sempre festivamente jovens. Você sabe fazer vibrar, nas suas telas e através de cores as mais expressivas, essa conciliação de tradição com paisagem. Continua a ser o didata que foi o grande Telles, de quem, menino, fui discípulo.

Você leciona pintura. Mas o ensino da pintura não o afasta da livre criatividade. Cada exposição sua vale por uma didática. Mas valendo por uma didática, é, sobretudo, uma festa para quem a visite. Os olhos se defrontam com imagens, formas, cores que os deliciam.

Um humanista inglês, célebre por suas malicias, escreveu certa vez que quem sabe fazer, ensina. Você Francisco Villa-Chan, como o antepassado ilustre, desmente tal malicia. Sabe fazer e sabe ensinar o que magistralmente faz.

Assim foi Telles Junior que, menino muito menino, repito ter tido como meu mestre de pintura. Mestre exigente. Menino um tanto diferente dos outros meninos, quase que castigou de palmatória. Fui diferente porque a verdade é que, tanto em pintura como em letras, não queria mestre. Queria tanto pintar como escrever sem aprender pintura nem gramática. Nunca nos entendemos. Mestre Telles Junior e eu.

Mas o que posso dizer desse desencontro entre mestre tão ilustre e discípulo tão rebelde é que, dentro do desencanto, houve um encontro entre um menino que admirava um velho glorioso e um velho que, mesmo ríspido, era um encanto de pessoa.

O descendente é o que repete do antepassado magnífico: ao encanto da arte, de que é senhor admirável, junta o encanto pessoal. Suas telas olindenses são as de um artista de modo algum impessoal em face dos assuntos que fixa e interpreta; e sim pessoalmente encantados por eles. Foi assim pessoalmente, deixando-se encantar por paisagens de Pernambuco, que Telles Junior deixou ao bom descendente que é você, Francisco Villa-Chan, o exemplo de uma pintura amorosamente pernambucana.

Gilberto Freyre
José de Souza Alencar - Alex
- O paisagista Villa-Chan
Na pintura, historicamente, a paisagem sempre teve e terá um capítulo especial. O homem motivado pela força e beleza da natureza tentando recriá-la á sua memória. Nos dias atuais nota-se uma tendência de certos pintores para retomar a paisagem como tema. Alguns sempre foram figurativos, mas, de repente voltam-se para o que a natureza oferece. Acrescente-se, que na história de quase todos os grandes pintores podemos encontrar momentos que ele dedicou à paisagem.

Aqui no Recife um sempre foi excelente paisagista e posso depor porque tenho visto a evolução dos seus trabalhos, de sua arte. Esse artista é Francisco Villa-Chan. Mesmo estando fora do Brasil, deixou-se fascinar pelas cenas do campo, pelo casario e pelas árvores como se antecipasse a necessidade de defendê-los.

Da fase pernambucana, digamos, há o predomínio dos coqueiros, em muitos quadros, do mar, da documentação de lugares que o tempo vai destruindo. E a memória, o visual é salvo pelos pincéis. Numa temporada portuguesa, na terra dos seus antepassados, também captou o espaço lá fora, como se costuma dizer, castelos, muralhas, aldeias, um Portugal que também começa a desaparecer.

Em todo esse conjunto um aspecto me parece fundamental na obra, no estilo Villa-Chan: a sua fidelidade ao traço, as pinceladas, muitas delas soltas, superpostas, para dar a continuidade, ao acabamento da tela. E também as cores, com os seus azuis e brancos aparentemente contrastantes do céu e a cor forte da natureza banhada por um generoso manto de sol. O brilho desse sol tropical que proporciona contrastes em árvores, campo, estradas, chão. Evolui mas não perde as características. Viaja, vê outras terras e paisagens para pintar mas mantém, em qualquer latitude, a essência intocada do seu estilo que é, afinal, a marca maior do artista, a sua assinatura mais nítida. Villa-Chan inaugura essa amostra com o que ficou em si nesse encontro com Portugal. E retornou maior, mais coeso e mais maduro como um dos grandes paisagistas da historia da pintura pernambucana.

José de Souza Alencar - Alex (JUN/1992)

Luíza Modesto

"De cavalete, tela e maleta, em que estão agrupadas as cores e pinceis em punho, VILLA-CHAN levanta muito cedo para ir in loco, pintar pontos históricos da cidade, mantém uma relação intima com os pinceis, telas e tintas. Com isso traços impressionistas, trás para os seus quadros casarios do Recife e Olinda coloniais, completando ou tirando o excesso daquilo que os seus olhos vêem".

Luíza Modesto (27/11/1987)
Mauro Mota
- Pintura de Villa-Chan
Folheando o “livro de recortes” de Francisco Villa-Chan, vejo que ele “iniciou” os estudos de desenho e pintura com Rachel Telles, filha de Telles Júnior, o primeiro grande pintor nascido em Pernambuco. É que de ambos descende, não só pelo aprendizado, o que o leva à condição de um bom parentesco artístico, afirmado agora nesta exposição, com prevalência da paisagem captada com uma doçura que emociona a gente o que significa um regresso, no melhor sentido, à expressão inicial de Villa-Chan que fora, vejo ainda no citado livro de recortes, substituída pelo abstracionismo, embora focando, mesmo de forma indireta, as implicâncias da arte popular até sobre a erudita.

Parta-se daí para uma das escolas mais faladas: a do mencionado abstracionismo em artes plásticas. O separatismo da arte popular é só indireto, camuflado pelas deformações. No caso dos resumistas, o arvoredo exposto só nas estrias radiculares; o urro do bicho feroz na cor mais violenta e acústica; o canto do canário-da-terra no amarelo menos de pena, mais audível. Um bairro e até uma cidade insinuam-se numa gelosia solitária, num bueiro de fábrica, ou, mesmo ainda, na fumaça dele, sob os condicionamentos ao modo por que a gelosia for plasmada ou a fumaça distribuída.

Esse o processo da criação ou da recriação artística, de exigências além das visuais, da circunscrição dos realistas. Poderia chamar-se de arte só visual à pintura – seja a de motivos e expressão tradicionais, seja a de estilos audazes – tantas vezes beleza pura, saudosismo, crítica social, música, interpretação? Tal equívoco de visualidade ocorre em extremos: do academismo ( o antigo e o novo) de gosto e fatura limitadamente universais, isto é, os mesmos em qualquer lugar, ao abstracionismo ( o antigo ou o novo) quando este anexa à sua alienação lógica (a das coisas objetivas) a da transubstanciação artística, e atrás dos quadros só fica mesmo a parede.

No percurso para o estágio culto, a outra arte não se dilui de todo, guarda, para si mesma, qualquer coisa de particularizante e intransmissível, o aroma e a pureza.

Daí a valorização, nova ainda no Brasil, de “primitivos” e “ingênuos”, embora às vezes transportada a uma sinonímia sem pé nem cabeça, a fusões e confusões provindas do âmbito comum de elementarismo. Mas elementarismo, recorde-se, ambivalente, levado em conta a distância, entre uns e outros, quase de antípodas quanto ao que se convencionou dizer a linguagem plástica. Os primitivos marcam-se por uma expressão meia de pictógrafos, simbilizante e fria; são mais de conversa em particular, de soluções ascéticas. Os “ingênuos” por serem claros e falantes na tradução dos seus colóquios com a natureza, as figuras e a dinâmica ambiente, no relacionamento de seres imaginados ou vivos, na magia de que se entendam sem o entendimento dessa diferença.

Isso não os vincula ao excesso de conteúdo ou forma. Expressam-se também em síntese, até somente pelas cores, sem individualizar os objetos e sem desindividualizar-se sob a atração das tendências cultas. O instinto artístico vale mais do que os currículos das escolas de belas-artes e estes nada significam sem ele. A faísca do talento é capaz de grandes iluminações. Nenhum exemplo histórico mais conhecido e ostensivo do que o de Paul Gauguim. Aos trinta e cinco anos, reage aos convencionalismos de emprego e família para entregar-se de corpo e alma à pintura. Faz-se um mestre universal sem mestre universal sem mestre.

O que isso mostra? Que o artista pode criar sozinho e sozinho obter as próprias criações, sem embargo da categoria. É o sugere os quadros de Francisco Villa-Chan marcados por um amos inexcedível à pintura.

Mauro Mota (NOV/1982)

Mário Hélio
- O Sertão e suas vibrações
Se há momentos em que o olho quer ter tato e assumir a sinestesia possível não de volume, mas dos atributos dos objetos, Villa-Chan resume um desses gestos nos seus quadros de paisagens ressecadas. Melhor dizendo: vistas. Pois, embora esteja atento aos valores da convenção, e os exercite, essa pintura como que reorganiza o conjunto de cada imagem como se fosse uma opinião, e não um simples comentário. Como se fosse uma epifania.

As pessoas, as coisas, os bichos estão nas suas poses características. Não há transgressões. Há uma espécie de expansão do que se vê em direção ao olhar. Portanto, o que há de ser a força desses quadros não é a temática, mas o modo de exercê-la. A sua expressão. No primeiro olhar, a terra prometida e a terra devastada do sertão são um mesmo objeto. O paraíso é o purgatório. O verde festeja os seus ocres. Tudo para o triunfo da luz e dos traços, tudo para rever a vegetação, nos seus cortes, na eleição dos seus halos e vibrações. Pois é de pintura de vibração e sensação que se trata. De pintura em que o rústico quer melhor desvelar-se, astuciosa cor, prenhe de símiles e revelações.

Mário Hélio (Nov/1998)

Paulo Azevedo Chaves

Francisco Villa-Chan é um artista que trocou as inquietações vanguardistas, o estar em sintonia com as tendências estéticas que predominam em determinadas épocas por uma pintura que reflete – em seu caráter reflexivo, em seu apaziguamento emocionam – sua maneira de ser na atualidade, o prazer de exercer bem o ofício, de pintar, o prazer – contido sem exacerbação – de viver e registrar aspectos belos do mundo que o cerca em sua produção pictórica, a opção pelo passado no presente.

Paulo Azevedo Chaves (18/11/1983)

Wellington Virgolino
- Recife nas Cores de Villa-Chan
Embora tenha uma profunda admiração pelos artistas que se agarram às vanguardas, se jagam atrevidos nos salões, com suas "instalações" fantásticas, seus objetos ousados e integrantes, devo confessar que sofro de paixonite crônica, aguda, por quem faz de sua pintura um ato de amor. Por quem, no meio de tantos desbravadores, de tantas palavras e gestos "pintados", de tantos "gênios" . . . ainda hoje se deixa levar, embevecido, pela beleza de um recanto, de um fundo de quintal, de um coqueiro solitário ou de um casarão esquecido.

Conheci Villa-Chan por volta dos anos sessenta. Era um engajado na "Pintura de Ação" do americano Pollock, que hoje, novamente em moda e rebatizada como "neo-expressionismo", "Expressionismo abstrato" (ou coisa que o valha), enche de comichões os mais novos. Depois não o vi mais. Fui encontrá-lo vinte anos adiante, maduro, sereno, fazendo uma mostra só de paisagens . . . e fiquei curioso. "Perdi a vergonha(ou ganhou) e hoje só pinto o que gosto. . . o que quero", me disse ele.

Agora, eis o Villa-Chan de 1987. Esqueceu os tons escuros do seu princípio, como paisagista e acadêmico, encheu-se de luz, clareou sua paleta e nos presenteia um Recife de pinceladas impressionistas, transbordante de cores e magia. Um Recife onde o verde é mais verde, o vermelho só vermelho, o azul mais azul e ele, Villa-Chan, muito mais Villa-Chan. Único. Fazendo realmente o que quer e o que ama. E muito bem.

Wellington Virgolino (NOV/1987)

Como Designer

Wellington Virgolino

Francisco Villa-Chan não deu férias aos seus pincéis e telas, muito menos as tintas; apenas resolveu acrescentar à sua forma de vida a de criar jóias.

As peças são uma mistura do Clássico com o popular. Do precioso Ouro com o que existe de mais regional, o rústico Couro, torcido e trabalhado, que numa feliz comunhão emocionam pela beleza e originalidade.

Assim, além de compor paredes e ambientes com seus quadros, o pintor, não satisfeito, abriu mais um leque criativo e passou a enfeitar também as pessoas. Sobretudo as mulheres .

E elas ficarão mais bonitas.

E ele realizado. Nasceu a linha de jóias "Courart".

Wellington Virgolino (set/1984)
Abelardo da Hora

Francisco Villa-Chan consegue realizar, com êxito, um sadio intercâmbio das Artes Plásticas com o Artesanato – nesse seu trabalho de Joalheiro. Noto um certo parentesco dessas jóias, até na sua sobriedade, com os adornos usados por cavaleiros e alguns ornamentos requintados de sua montaria. Refiro-me a ornamentos, tais como anéis de rédeas, estribos, selas, cabos de rebenques e cinturões, onde os trabalhos feitos em couro e metais têm o seu ponto alto e tradição firmada. Utilizando o couro retorcido produzidos por nossos artesãos, em conjunto com a prata e o ouro, um diálogo feliz, sob o comando de um belo desenho, Villa-Chan consegue como resultado uma Jóia sóbria e agradável.

Abelardo da Hora (out/1984)
Gilberto Freyre

“Cada criação sua, é um ato de artesão, de artista, de joalheiro terno. Liricamente identificado com sua criação de artista. São jóias que podem brincar com as possuidoras, quando não de um tipo dinisiacamente quase esportivo. Mas, quando de outro tipo – o apolíneo – seu desempenho é outro: dão uma dignidade e até uma nobreza à figura feminina que a ostente que, entretanto, não vai ao extremo de jóia solenemente convencional e hirtamente clássica.”

Gilberto Freyre
Luiz Pessoa

“Lidando com o ouro, a prata, o couro traçado, o diamante e pedras semi-preciosas brasileiras, procurando expressões em anéis, pulseiras, gargantilhas, etc. VILLA-CHAN busca uma linguagem e concepção formal e orgânica, plasticamente nordestina tropical, infenso do estilismo internacionalista e modal." Luiz Pessoa
Luiz Pessoa

Villa-Chan nos dá, através desta sua exposição de jóias, lançamento da linha e coleção COURART, uma bela e agradável surpresa. Pintor e restaurador, bisneto do grande pintor Telles Júnior, exprimindo-se agora tridimensionalmente nestas jóias que trazem o seu desenho, design e griffe. Artista, artesão e designer, este tripé de formulações, atividades e recursos, aliados ao seu talento, além de herança umbilical e familiar no campo da joalheria, dá-lhe base e conhecimento de causa e dos materiais para esse difícil metiê. Lidando com o ouro, a prata, o couro trançado, o diamante e pedras semipreciosas brasileiras, como a esmeralda, o ônix, o topázio, a turmalina, a ametista, e procurando expressões em anéis, pulseiras, gargantilhas, brincos, etc., ele busca uma linguagem e concepção formal e orgânica, plasticamente nordestina e tropical, infenso do estilismo internacionalista e modal. Projetando não só a jóia (design de produto), bem como sua própria marca e embalagens (design gráfico), Francisco também cria e confecciona de maneira única, artesanal e lúdica, fugindo de influências e ortodoxismo do design (gestaltung) bauhausiano racionalista. Com esta linha e coleção de jóias, ganharam as mulheres e musas que se adornarão com bom gosto e sensibilidade.

Luiz Pessoa
Antigo Engenho Poeta, outubro de 1984
Villa-Chan
- Depoimento do Artista
No meu trajeto diário pela ponte metálica da Boa Vista, observando as inúmeras barracas que expõem vários tipos de artesanatos e guloseimas típicas da nossa região, um material em particular chamou bastante a minha atenção o couro em tiras retorcido. Encomendei então algumas tiras do referido material, e iniciei alguns desenhos de encaixes, para produzir peças – artesanato, combinando-as com o ouro a princípio, o que apresentou um singular efeito de rusticidade, incentivando-me, assim, cada vez mais desenvolver design sofisticados e originais, acrescentando outro metal como a prata, nossas lindas pedras semipreciosas e outros elementos de composição, dando origem à coleção COURART, que ora apresento.

Villa-Chan(out/1984)
Wellington Virgolino

"As peças de Villa-Chan são uma mistura do clássico com o popular. Do precioso ouro com o que existe de mais regional, o rústico couro torcido e trabalhado, que numa feliz comunhão emocionam pela beleza e originalidade."

Wellington Virgolino